A monstruosidade (dos nossos - os ascorosos - sonhos)
A aberração suprema percorre a mente dos monstros que sonham durante a noite. Aqui, as leis da Natureza desmoronam-se. A candura e a inocência caem e arruínam-se. O imaculado esconde-se e refugia-se. A beleza não agrada. A disformidade não enoja. A chuva ergue-se do chão em direcção ao infinito. O fogo não queima e o tempo não passa. O Sol esconde-se do dia. E a Lua reina durante todas as noites.Durante estes sonos não há paz e a repulsa e o horror deambulam em prazer. Nas primeiras noites frias de Outono são os nossos sonhos que prevalecem e andam mais fortes. Os limites cedem e deixam-se vergar. Nós, os seres escamosos e pustulentos, caminhamos confiantes e seguros. À nossa mercê, os nobres e formosos não têm esconderijo. E vislumbram, pasmados, a nossa momentânea magnificência. E naquele breve instante ela, harmoniosa, não resistiu a lançar-lhe um olhar, quase de desafio. Já tão perto tinham estado, numa outra altura semelhante, de se tocarem e sentirem. Aquilo não era certo. Mas pouco há a fazer quando os braços deles chamam um pelo outro...
"Finalmente tinha encontrado alguem igual a mim!... De agora em diante eu não estava mais só nesta vida!... As suas ideias eram tal e qual as minhas!... Eu estava diante do meu primeiro amor!"